16 abril 2023

LAAD 2023 – notícias, esperanças e a dura realidade


Por Flávio Carvalho*

Esta semana, depois de quatro anos de ausência, teve seu encerramento na cidade do Rio de Janeiro a maior feira de negócios voltada pra sistemas de defesa e segurança na América Latina, a LAAD – Defesa e Segurança 2023. Com quase vinte anos de existência, e persistência, a LAAD começou como LAD – Latin American Defentech, no distante ano de 2003, ainda na primeira década deste novo século com o objetivo de ser um ponto de encontro, e de referência, para a indústria de defesa e segurança nacional, com pretensões, para a época, de se tornar, também, uma das maiores do gênero no mundo, e a maior do hemisfério sul. Embora ela ainda não seja considerada uma das maiores do gênero a nível mundial, é fato que a LAAD hoje pode ser considerada, ao menos na opinião deste autor, a mais importante feira de defesa e segurança do hemisfério sul, e com louvor. A feira, que começou pequena e tímida, como quase todas, hoje é um marco dos negócios da área de defesa e segurança, reunindo em seus estandes delegações e representantes de empresas e governos de centenas de países dos cinco continentes. Os principais players mundiais se fizeram presentes. E entre novos e velhos conhecidos, os números de feiras anteriores demonstrados – este ano ainda não tinham sido publicados até o momento em que escrevo este texto – não deixam dúvidas da pujança da mesma e sobretudo da qualidade da sua administração, e que os objetivos para os quais foi pensada foram quase todos alcançados.

Feiras e eventos, sejam no mundo acadêmico, de negócios ou educacional sempre são vistos como uma oportunidade para trocar ideias, ver e ouvir novas ideias e pessoas, mas principalmente para verificar se o que estamos pensando e fazendo em casa está anda de acordo com o que efetivamente traduz os movimentos do mundo lá fora, e se não estamos em outras ‘vibes’ que não aquelas que dão o tom do que move o conhecimento e, seus avanços. E como não se pode deixar de notar, conhecimento, ontem, hoje, amanhã e depois é poder. Sempre. Por mais que tenhamos atravessado tempos em que isto foi posto seguidamente à prova. E continua sendo na verdade. Mas no caso das feiras, elas servem para mostrar também para onde podemos dirigir nossos esforços a fim de permitir estar o mais perto possível do nível superior da tecnologia, do conhecimento e da produção do saber humano. E a LAAD não é diferente neste aspecto. Pelo contrário, ela é muito boa no que faz e pretende.

Este ano de 2023 tivemos uma expectativa muito grande em relação à presença não apenas de novas empresas, produtos e soluções assim como o retorno esperado de empresas nacionais e estrangeiras que tradicionalmente marcam presença no evento, uma vez que possuem contratos com o Ministério da Defesa e/ou forças armadas no Brasil, participando direta e/ou indireta dos Projetos Estratégicos hora em andamento, além daquelas que promovem seus portfólios de soluções para demandas não atendidas ou que estão em aberto à espera de orçamento ou de processos seletivos por iniciar ou terminar. Este é o caso da VBCOAP SR, VBC CC e VBC Fuz do Exército Brasileiro, assim como o programa Defesa AAe, que no momento ainda está na fase de estudos de conceito e providências para determinar seus requisitos finais esperados para este ano ou mais tardar em 2024. Há ainda a questão da modernização dos blindados EE-9 Cascavel e Leopard 1A5, nas mãos da AKAER e contrato já assinado, enquanto o CC alemão aguarda uma definição. De antemão sabe-se que não há predisposição financeira e orçamentária para tocar todos estes projetos ao mesmo tempo no curto e médio prazos, apesar do atual governo dar a entender que se está buscando soluções para esta questão, quase que insolúvel, menos por dificuldades técnico-administrativas, e financeiras, do que da ausência pura e simples de vontade real para mudar a capacidade de investimento e custeio na Defesa.

Em todo caso, faltam caminhar, também, soluções práticas à artilharia de campanha, às armas de comunicação e engenharia, à logística e ao material bélico, passando pela aviação do exército – Avex, escolas e centros de estudos/formação até simples recursos para o dia a dia das organizações militares. Tudo no exército, como de resto nas demais forças, de modo geral em situação mais ou menos igual, tornou-se sua resolução uma urgência, dado que o jogo de empurra de um governo a outro e a permanente procrastinação de soluções relativas à Defesa seguidamente durante décadas jogaram as ffaa’s brasileiras em uma situação de quase insolvência material ao mesmo tempo. E sem muitas perspectivas reais, diria, críveis, em relação a mudar o quadro conhecido, a LAAD veio que como um respiro em meio à tempestade, com muitos desafios a serem vencidos. E neste aspecto, a feira trouxe várias novidades importantes, e também, muitas boas expectativas sobre novos negócios e possibilidades de desenvolvimento de soluções para as demandas do país no setor.

Podemos dizer que a LAAD trouxe para o setor de defesa várias notícias que ajudaram a restabelecer a crença de que o tema seja levado a sério e que a indústria de defesa e segurança possa de fato começar a usufruir das promessas e iniciativas no campo da gestão pública engendradas nos últimos anos mas que acabam por não sair do papel. Tivemos uma ótima participação da Embraer que se destacou pelo memorando de entendimento com a SAAB, e pelos anúncios da Avibras, que mesmo em situação financeira precária, demonstrou confiança no seu futuro, demonstrando novas versões do ASTROS 2020, e mesmo um novo projeto na proposta para um ASTROS 8X8. Assim também se destacaram a AKAER e a Stella Tecnologia com seus drones, dentre outros produtos. Existem muitas outras empresas que se destacaram, como a novata EDGE Group dos Emirados Árabes Unidos, que apresentou um portfólio de produtos inovador, tecnológico e abrangente, atraindo a atenção de todos na feira. Vale a pena dizer que a participação de pequenas empresas nacionais que estão pela primeira vez participando da feira por meio da ABIMDE foi uma ótima notícia. Salvo engano, foram cerca de 20 novos empreendedores que se juntam à LAAD a fim de mostrar seus produtos e soluções para um mercado reconhecido no mundo todo como altamente competitivo e tecnológico. Isto mostra que a nossa capacidade de inovar, e também de investir, em áreas mesmo dominadas por grandes trades é obviamente riquíssima. E a presença destas empresas só faz confirmar um dos objetivos primários da LAAD que é ser um centro de referência para o setor de defesa e segurança no Brasil, contribuindo assim para consolidar a área como fulcral para o desenvolvimento do país, e consequentemente para acercar-nos de capacidades e competências em casa para a Defesa que só pouquíssimos países dispõe, e são capazes de manter.

O maior destaque deste ano da LAAD a meu ver ficou por conta de trazermos à baila mais uma vez a oportunidade de jogar luz sobre o tema da Defesa Nacional, de forma mais madura, e de preferência, sem as idiossincrasias pseudoideológicas e políticas que sempre acompanham o tema no Brasil. Defesa, como tenho ressaltado, é Política de Estado, e para tal, tem de ser não apenas vista assim, mas tratada efetivamente enquanto tal por todos que os atores que por obrigação legal, institucional e/ou profissional, devem zelar pelos interesses do país e de sua sociedade. Novamente estamos falando, nas palavras do atual ministro José Múcio, em trazer o debate sobre o financiamento da indústria de defesa no Brasil – os propalados 2% do PIB - e por conseguinte, debater a perenidade, a regularidade, a previsibilidade, a razoabilidade e o planejamento público da manutenção de investimentos e custeio permanentes na atualização de nossos meios de defesa através das forças armadas e nossos militares.

Não é aceitável que um país como o Brasil seja capaz de realizar tão pouco em sua própria Defesa a bem de ser considerado senão o primeiro, dos mais destacados no mundo em diversas áreas, mas ao mesmo tempo, inconsequentes e irresponsáveis em manter o que nos foi legado pelo esforço de nossos antepassados. E isto é uma abertura perigosa para que outrem se achem competentes para suplantar seus interesses sobre nós, mesmo que isso signifique impô-los pela força. A história é marcado por exemplos de nações que embebidas em seu próprio ego, ou alienação, naufragaram perante outras, as vezes mais fortes, as vezes até mesmo mais fracas, por se descuidarem ou não aceitar o fato de que um país, sociedade, povo ou nação não é forte apenas por pensar de si mesmo o que outros não a tem em conta.

Portanto, vamos torcer, e cobrar quem de direito, que a LAAD ajude-nos a acertar desta vez sobre as escolhas que fizemos para a nossa Defesa Nacional. Porque o existir ou não dela também é, sempre, uma escolha Política – com ‘P’ maiúsculo mesmo – de cada um de nós.


*Sobre o autor: Flávio Carvalho

Administrador, Pedagogo, Professor e Mestre em Teologia

É Professor Adjunto na Faculdade de Educação da Universidade Federal do Amazonas – FACED\UFAM

Educador e pesquisador em Educação, Políticas Públicas Educacionais, Gestão e Planejamento Público em Educação e Direito Educacional.

Estudioso de História Militar, Geopolítica, Estratégia, Relações Internacionais, Defesa Nacional.

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