27 fevereiro 2020

Com venda recorde no exterior, indústria brasileira de defesa terá incentivo federal

Setor registrou US$ 1,3 bilhão em exportações no ano passado, maior valor em 50 anos


Cargueiro KC-390, maior aeronave militar já produzida pela Embraer, é um dos produtos da indústria nacional de defesa que o governo quer ajudar a destacar na vitrine internacional, ampliando mercados lá fora - Foto: Lucas Lacaz Ruiz / Agência O Globo

Por Eliane Oliveira

BRASÍLIA - Aeronaves, embarcações, ferramentas cibernéticas para proteção de dados, radares, sistemas seguros de comunicação, armamento, entre outros itens de alta tecnologia, contribuíram para que a indústria brasileira de defesa registrasse US$ 1,3 bilhão em exportações em 2019, o maior valor em 50 anos.

O governo prevê um acréscimo de 30% no total exportado pelo setor este ano e um potencial para atingir a cifra de US$ 5 bilhões em até três anos. Para isso, elabora um plano nacional para aumentar as vendas internacionais, atrair empresas do exterior para o país e estimular a formação de associações entre companhias nacionais e estrangeiras.

No governo, que conta com participação cada vez maior de militares, a avaliação é que a indústria nacional de defesa foi negligenciada nos últimos 30 anos. A partir de agora, o plano é aprofundar o papel do BNDES — que já financia as vendas desses produtos no mercado externo — na expansão das exportações de produtos de defesa.

Na última quinta-feira, o banco assinou um protocolo com o Ministério da Defesa, para elaboração de um plano de ação com esse objetivo. Melhores condições para os tomadores de empréstimos para viabilizar a exportação de itens estão entre as medidas a serem adotadas.

— O objetivo é ampliar as exportações brasileiras e, com isso, reduzir a dependência (do setor) do Orçamento das Forças Armadas — diz Marcos Rossi Martins, superintendente da Área de Indústria, Serviços e Comércio Exterior do BNDES, sem entrar em detalhes sobre como será a execução do plano.

Busca de novos mercados


No caso da associação entre empresas brasileiras e estrangeiras em outros países, um exemplo recente é a joint venture entre a fabricante brasileira de armas Taurus e a siderúrgica indiana Jindal Steel, anunciada na Índia, durante visita do presidente Jair Bolsonaro àquele país, em janeiro.

A nova empresa, da qual a Taurus terá 49%, vai produzir armas de pequeno porte e aproveitar a expertise da companhia brasileira, que fará a transferência de tecnologia.

Atualmente, os principais compradores de produtos de defesa brasileiros são Oriente Médio, África e América Latina. A ideia é ganhar espaço, também, nos países asiáticos, como China, Índia e Indonésia. De acordo com o Itamaraty, o Brasil exporta para 133 países. A participação em feiras internacionais e a realização de missões também farão parte dessa agenda.

Apesar da alta nas vendas ao exterior, o Brasil contabilizou um déficit de US$ 700 milhões na balança comercial do setor no ano passado com cerca de US$ 2 bilhões em importações. O Brasil importa, principalmente, plataformas terrestres e aeronáuticas. O novo plano de ação tem como meta reduzir a dependência das Forças Armadas brasileiras de produtos estrangeiros. Assim, além da questão econômica, o governo optou por estimular uma base industrial de defesa por razões estratégicas.

— A soberania nos permite nos livrarmos da dependência tecnológica, ou do cativeiro tecnológico. O desejável é que nossas Forças Armadas tenham condições, de uma maneira autônoma, de adquirir os meios para manter seu preparo, a sua prontidão, e cumprir suas missões constitucionais e institucionais — diz Marcos Degaut, secretário de Produtos de Defesa do Ministério da Defesa.

A indústria de defesa tem uma peculiaridade: todos os negócios do setor são controlados pela pasta da Defesa e pelo Itamaraty. Os dois ministérios fazem análises prévias sobre a venda de um produto a determinado país, com base no risco político e nas relações diplomáticas. Em eventos internacionais, é obrigatória a presença de uma comissão das duas pastas. Diferentemente de outros setores, o comércio de produtos de defesa entre dois países é feito de governo para governo.

Parceria com Portugal


Portugal, por exemplo, está na lista dos países com interesse direto na produção brasileira na área de defesa. O país foi o primeiro a adquirir aviões KC-390 fabricados pela Embraer. O contrato, fechado no ano passado, também prevê suporte, serviços e simulador de voo, como parte do processo de modernização da Força Aérea portuguesa. As entregas do cargueiro militar começam em 2023. Empresas portuguesas participaram do desenvolvimento de peças para a aeronave, assim como companhias argentinas e tchecas.

A Associação Brasileira das Indústrias de Materiais de Defesa e Segurança (Abimde) lembra que o Brasil esteve na década de 1980 entre os dez maiores exportadores de produtos de defesa no mundo. Segundo a revista americana Defense News, em 2019 o Brasil estava na 84ª posição entre os cem maiores exportadores.

De acordo com a Abimde, as exportações de produtos de defesa, em geral, ainda são pequenas, e poucas empresas brasileiras conseguem se inserir no mercado mundial do setor, que é altamente competitivo e dinâmico. Requer investimentos em pesquisa e desenvolvimento. O cenário empresarial interno não é favorável, destacou a entidade, em nota.

Saleio Nuhs, presidente da Taurus, lembra que na Estratégia Nacional de Defesa do governo há regras de acordos de compensação importantes para as indústrias nacionais. Por esse mecanismo, em caso de importação de produtos de defesa, a exemplo de armas de fogo, deve haver, como condição para a compra, uma compensação tecnológica, industrial ou comercial por parte da empresa estrangeira contratada.

— O objetivo de tal contrapartida é evitar a dependência tecnológica de fornecedores estrangeiros, assegurando condições para o fortalecimento da base industrial de defesa em busca da autonomia, que estaria comprometida caso o país passasse a depender dos produtos fabricados no exterior — diz Nuhs, que se queixa da alta carga tributária como um fator que tira competitividade do setor.

FONTE: O Globo

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